O paradoxo da morte de Zenão
Zenão de Eleia está a duas horas da sua própria morte. Cansado, senta-se para escrever um pouco. Depois de tanto tempo a desafiar a realidade do movimento, o simples esforço de mover o seu corpo já o fatiga. Sem dar conta, na escuridão do seu quarto, apenas iluminado por uma vela, já encheu páginas de novos paradoxos a desenvolver. Zenão está agora a uma hora da sua morte.
Pega no primeiro e naquele que mais interessante lhe parece ser. Vai desenvolvê-lo em primeiro lugar. Reduzi-lo ao absurdo, transformar a realidade em contradição. Recomeça a escrita. Já quase não necessita pensar. Recriar está-lhe no sangue. Zenão não termina o primeiro, sente-se mal, está a trinta minutos da sua morte.
Levanta-se com esforço. Algo, no seu corpo, lhe diz que não está bem. Procura, na escuridão, o catre onde dorme todas as noites. Deitado se sentirá melhor, pensa. O esforço de atravessar o seu quarto deixa-o sem forças. Cai na sua cama como que desfalecido. Sem adormecer ainda pensa que conseguirá o seu melhor paradoxo. Zenão está a quinze minutos da sua morte.
A respiração de Zenão afunda-se, alonga-se. Julgar-se-á que dorme, mas não. Zenão, apesar de estar a cinco minutos da sua morte, ainda pensa.
O seu corpo envelhecido, dorido, quer descansar. Zenão ainda não o permite mas pensa se este não terá sido, afinal, um dos seus últimos escritos. Zenão tem um minuto para viver.
Agora sim, o corpo de Zenão traiu-o, já não responde. Mas o seu cérebro ainda insiste. Poderá não escrever mas nada o impedirá de pensar. Zenão tem trinta segundos para meditar.
É o que faz. Tem agora 15 segundos... 5 segundos... 1 segundo... 0,5 segundos... 0,25 segundos... 0,125 segundos... 0,0625 segundos... 0,03125 segundos... 0,015625 segundos... 0,0078125 segundos. E pensando assim até à eternidade, Zenão julgar-se-á imortal.
ASENSIO